A nespereira trouxe os seus frutos repentinos

Poesia Vasco Gato

A nespereira trouxe os seus frutos repentinos
à reclusão dos meus olhos.
São proezas que agradeço,
embora desprovidas de destinatário.
A árvore eleva-se
dos elementos dispersos no subterrâneo,
condensando uma cápsula
de vida futura.

Quantos de nós não estarão
a fazer o mesmo
sob a película da letargia?

Coisas fundas ascendendo despercebidas,
à espera do momento
em que alguém as veja num movimento
tão desprevenido
como o meu ao sentar-me junto da janela
que dá para o quintal.

Do outro lado da casa,
as crianças gritam aos transeuntes
saudações que parecem precipitar-se
para a rua como grandes aves.
Receio e sorriso misturados,
um braço que se ergue para retribuir.

Somos claramente melhores
quando passamos por velhos conhecidos.