Dois poemas de Luljeta Lleshanaku

Poesia Vasco Gato (tradução)

PRISIONEIROS

Os prisioneiros
culpados ou não
têm sempre o mesmo ar quando são libertados:
patriarcas destronados.

Aquele acabou de atravessar o portão
de cabeça pendida apesar de não ser alto
gestos como os de um beduíno
ao entrar na tenda
que acartou às costas o dia inteiro.

Cortinas de algodão, paredes de pedra, o cheiro a lima queimada
fazem-no recuar ao momento
em que a guerra fria terminou.

No outro dia penduraram o seu lençol no pátio
como se a ostentar a mancha de sangue
após uma noite de núpcias.

Rostos deslustrados pelo sol
rodeiam-no, só olhos e ouvidos:
«Com que é que sonhaste ontem à noite?»
Os sonhos de um prisioneiro
são pergaminho
sacralizado pelos seus trechos em falta.

A irmã está ainda a descobrir os seus hábitos estranhos:
os pedaços de pão escondidos em bolsos e debaixo da cama
o rachar incessante da lenha para o inverno.

Porquê este medo?
O que poderá ser pior do que a vida na prisão?

Ter escolhas
mas ser-se incapaz de escolher.


COMPREENSÃO MÚTUA

                        Para a minha filha Lea, de dois anos

Não consigo esquivar-me ao teu olhar de girassol,
Não me julgues pelo que me falta,
Um instinto maternal
Que como botija de água já fria
Vai parar aos pés da cama.

Compreende-me, eu sou como tu,
Sempre curiosa sobre o que se passa entre duas pessoas,
Tal como tu
Desconfio que seja algo sem história,
Como uma maçã a que só damos uma dentada
Para depois a deitarmos fora sem remorsos.